Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? Qual o sentido da vida? Essas e outras perguntas de cunho existencial costumam integrar a história das pessoas, permeando suas crenças, valores, relações e até mesmo o desenvolvimento de suas atividades profissionais. Provavelmente são perguntas da essência do ser humano, que em geral se fortalecem a partir das realidades e experiências de cada um ao longo da vida.
Evidentemente, em alguns momentos históricos ou de conflitos sociais que marcam determinadas épocas, as perguntas existenciais eclodem com maior relevância; em outros, são esquecidas, sufocadas por afazeres que se multiplicam na busca de produtividade e de resultados diversos, “desfocando” as pessoas daquilo que as move, dos seus propósitos, do que elas são e do que realizam e gerando certa “alienação”.
Atualmente, nas relações do mundo do trabalho, perguntas existenciais vêm ganhando relevância sobretudo em meio aos líderes executivos. Como tônica central está a questão do propósito – ou seja, do sentido daquilo que se realiza enquanto profissional: o que faço tem propósito? Tem sentido? Faz com que me sinta realizado?
Refletir sobre os pressupostos do trabalho com propósito, com sentido, remete-nos a pensar sobre a finalidade do que fazemos e, ao mesmo tempo, a reconhecer-nos naquilo que produzimos. O filósofo e escritor Mario Sergio Cortella, em sua obra Por que fazemos o que fazemos?, instiga-nos a pensar sobre o valor do trabalho e seu propósito: “O propósito original do trabalho é que não nos deixemos morrer. Afinal de contas, somos seres de carência, de necessidade. Ou construímos o nosso mundo ou não há como existir”.
Atualmente, nas relações do mundo do trabalho, perguntas existenciais vêm ganhando relevância sobretudo em meio aos líderes executivos. Como tônica central está a questão do propósito…
Amaro França
Em um tempo marcado por relações de trabalho do tipo cada vez mais, cada vez maior, cada vez mais rápido – chavões de um mercado frenético –, permeadas pelo uso exacerbado das novas tecnologias e modelos de produção que levam muitas vezes à exaustão, é pertinente refletir e colocar em xeque a “laborlatria” – neologismo que expressa o conceito de adoração, de extrema valorização do trabalho, refletido em algumas práticas atuais de workaholics. Caso contrário, podemos nos tornar autômatos, o que traria como consequência a alienação daquilo que executamos enquanto profissionais.
Com certeza, desempenhar o trabalho de modo automatizado apaga a dimensão de realização de cada pessoa. No dizer de Cortella, “Nessa hora, eu me desumanizo, isto é, me aproximo do mundo das máquinas… No trabalho alienado, desumanizado, não existe a percepção autoral”.
Viver experiências, ver-se representado na obra que se faz e naquilo que se realiza enquanto profissional é necessário. “Esse movimento de experimentar a mim mesmo significa que o propósito da minha vida é ter consciência de que não sou descartável. Se não sou descartável, eu me experimento naquilo que faço. E, dessa forma, preciso ter reconhecimento de autoria”, afirma Cortella.
Resgatar e respeitar alguns ritmos, ritos, protocolos, com seus elementos simbólicos e de significados, construídos nas relações pessoais e organizacionais, poderá ser um caminho assertivo na constituição do exercício da função e do cargo de liderança nos espaços de convivência
Amaro França
Muito provavelmente, um dos fatores que têm contribuído para não se perceber, sentir e ser reconhecido em sua dimensão autoral está ligado à rapidez com que tudo acontece ou, por que não dizer, à horizontalidade imediatista das relações que se travam no cotidiano.
Nessa dinâmica relacional, está se perdendo a essência do rito, elemento constitutivo presente na história humana, na identidade do ser pessoa e do ser profissional. Afinal, somos seres que seguimos ritos e ritmos. “Nós somos seres cíclicos… os ciclos são a grande marcação para a nossa vida não ser caótica, especialmente os da natureza”, diz Cortella.
Resgatar e respeitar alguns ritmos, ritos, protocolos, com seus elementos simbólicos e de significados, construídos nas relações pessoais e organizacionais, poderá ser um caminho assertivo na constituição do exercício da função e do cargo de liderança nos espaços de convivência.
Sob essa ótica, cada pessoa é e desempenha papel significativo, independentemente da função exercida na organização que integra. Afinal, “as empresas são as pessoas que nelas atuam. Boas pessoas, em geral, constituem boas empresas. E essas pessoas buscam permanentemente respostas que justifiquem suas ações e razões”, diz Marcus Garcia de Almeida, na obra Sucesso! Uma questão de identidade. Em outras palavras, elas buscam os porquês do seu fazer, o seu verdadeiro propósito, pois, como explica Anselm Grün, na obra A arte de ser mestre de si mesmo para ser líder de pessoas, é “precisamente no seu trabalho que sua alma se revela”.