Os últimos anos têm sido especialmente desafiadores para os profissionais de recursos humanos e gestores de pessoas. A dinâmica do mercado de trabalho e das relações mudou, e muitos profissionais ainda se questionam o que isso significa a médio e a longo prazo.
Diversos estudos preliminares estão ocorrendo nessa área e muitas organizações estão testando suas hipóteses sobre o que funciona ou não para cada cultura. Mas, de forma geral, podemos observar algumas tendências para 2023, especialmente no mercado de tecnologia.
Neste artigo, espero compartilhar um pouco das reflexões que observei em diversas leituras sobre o assunto, além da visão prática. De forma sintetizada, compartilho as oito principais tendências para os próximos anos, no que diz respeito aos desafios de Recursos Humanos.
Importante salientar que se trata de algumas reflexões e hipóteses não exaustivas, uma vez que tudo está em constante movimento e evolução.
1. Flexibilidade
As pessoas desejam cenários mais flexíveis de trabalho e seguirão querendo isso. Em estudo realizado pela Revelo, 83,4% dos entrevistados preferem a flexibilidade que o home office traz e apenas 16,2% informam que o regime híbrido é a primeira escolha.
O que está por trás disso? Os hábitos e as prioridades mudaram durante a pandemia. Para muitos, não gastar tempo no trânsito, poder viajar ou passar mais tempo com a família são prioridades neste novo momento. Ainda, durante a pandemia se observou uma descentralização da força de trabalho. Muitas pessoas se mudaram das grandes cidades, buscando mais qualidade de vida e custos menores.
Apesar dos movimentos de retorno ao presencial de grandes companhias tecnológicas, que acompanhamos meses atrás, já podemos ver algumas reconsiderando ou avaliando outras modalidades como, por exemplo, ida ao escritório uma vez ao mês ou a cada trimestre para ações presenciais com a equipe. O grande desafio das organizações será equilibrar as expectativas das pessoas que trabalham nas empresas com suas lideranças.
Se a decisão for pelos diversos formatos de trabalho, como fazer todos os colaboradores se sentirem parte da mesma forma? Como incluir aqueles que estão 100% em teletrabalho com quem trabalha presencialmente? Essas perguntas precisam ser respondidas no planejamento do RH.
2. Espaço de trabalho
Tendo em vista que a flexibilidade do trabalho veio para ficar, um novo desafio se intensifica: como manter nos espaços virtuais o senso de pertencimento, cultura e interação que as pessoas tinham nos escritórios físicos?
Nesse sentido, um estudo feito pelo Gartner afirma que os investimentos em ambientes totalmente virtuais aumentarão significativamente, na busca por criar cada vez mais experiências imersivas e tecnológicas nos “intraversos” (metaversos de cada organização).
Não estamos falando de aumentarmos o volume de reuniões nas diversas plataformas de videoconferência. Trata-se de outra forma de se relacionar e viver momentos, explorando tecnologias imersivas. Aqui, mais uma vez, há um impacto nos espaços físicos. Como conectar o on-line e o off-line de forma realmente interessante, intencional e com propósito? É sobre isso que os gestores devem refletir.
3. Humano no centro
One size doesn’t fit all. O mercado tem olhado cada vez mais para a experiência do cliente e o conceito de customer centric, o que também se aplica à gestão de pessoas.
Conforme estudo do Gartner, as empresas que fornecem uma abordagem centrada no ser humano podem ver a fadiga da força de trabalho reduzir em até 44% e o desempenho melhorar em até 28%.
Compreender o que é valor real para as pessoas da organização e desenvolver estratégias, além das monetárias, serão fundamentais.
O trabalho e a vida pessoal nunca estiveram tão misturados como atualmente. O momento que vivemos fez que muitas pessoas revissem suas prioridades e decidissem focar em outros aspectos da vida – que não só carreira, dinheiro e crescimento salarial rápido. Com isso, aspectos relacionados a equilíbrio, saúde mental, entre outros correlatos, nunca foram tão importantes.
Olhar para o indivíduo de forma mais completa, além do ‘profissional’, será o mínimo para as empresas continuarem atrativas e competitivas.
4. Volatilidade do trabalho
As companhias estão vivendo altos níveis de turnover, com impacto na operação, na manutenção do conhecimento interno e nos clientes e resultados financeiros.
Não é à toa que a pauta de aquisição de talentos e retenção está tão presente nas organizações ultimamente e que muito se observa e se fala sobre movimentos como great resignation, burnout, quiet quitting, fatfire, além dos layoffs como forma de adequação ao cenário econômico global.
Em um futuro próximo, vejo muitas organizações lutando para garantir consistência e estabilidade em suas operações, tendo em vista a volatilidade do trabalho. O desafio será olhar para os processos, documentações e gestão do conhecimento, além de proteger os talentos que a organização não pode perder.
5. Diversidade, equidade e inclusão | ESG
Segundo previsão realizada pelo Gartner, até 2025 as empresas que corrigirem as disparidades salariais documentadas entre gêneros diminuirão o turnover das mulheres em 30%, reduzindo a pressão sobre a escassez de talentos. Com a pressão social e de investidores para demonstrar D&I, mais e mais empresas tornarão públicas suas informações sobre diferenças salariais. O fortalecimento do tema ESG contribui com esse movimento nas empresas, que deverão acelerar práticas de diversidade, equidade e inclusão.
6. Talentos
No mercado tech, segundo pesquisa da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom), já havia uma estimativa de um déficit de, aproximadamente, 800 mil profissionais em 2025. Para os próximos anos, os empregadores seguirão sofrendo com uma recessão e restrição de profissionais qualificados. Formar talentos e cuidar dos que você tem segue sendo uma prioridade e um desafio para os executivos, pois pode restringir o crescimento, impactar negativamente a marca e corroer a vantagem competitiva da empresa.
7. Efetividade da liderança
Creio que nunca se exigiu tanto das lideranças como atualmente. O ambiente está ainda mais complexo e novas variáveis de gestão trazem uma dinâmica muito diferente da que esses profissionais estavam acostumados ou foram desenvolvidos para.
Além da competência de gerir os negócios e pessoas, agora também será ainda mais exigido que os líderes sejam autênticos, empáticos e adaptáveis. Há um novo apelo à liderança: ‘liderança humana’.
Para além das conversas de carreira e das atividades em si, a gestão será fortemente convidada a olhar para o indivíduo de forma completa, humana, com todos os dilemas e bônus associados a isso.
8. Gestão da mudança
As transformações digitais, a incerteza econômica e as tensões políticas levaram a muitas disrupções. Aquela frase já conhecida por muitos, “à única certeza é a mudança”, nunca foi tão verdadeira. O fato é que depois de tantas mudanças difíceis, que exigiram adaptações importantes na vida das pessoas, estamos cansados.
Importante refletir que os funcionários também estão ficando mais resistentes à mudança e com menos vontade de embarcar em mais uma jornada rumo ao desconhecido. Para elucidar isso, em 2016 a Pesquisa Gartner Workforce Change mostrou que 74% dos funcionários estavam dispostos a mudar comportamentos de trabalho para apoiar mudanças organizacionais, mas esse número caiu para 38% em 2022.
A habilidade de gestão da mudança e a comunicação clara, assertiva e empática em todos os níveis da organização serão fatores ainda mais imprescindíveis para as evoluções necessárias nos negócios, em maior ou menor intensidade, dependendo do segmento de atuação.
Por fim, uma última constatação: o jogo mudou. Quanto antes compreendermos isso e nos adaptarmos, desenvolvendo estratégias e soluções que coloquem as pessoas no centro das nossas decisões, maior vantagem competitiva teremos diante dos desafios.
Podemos ver isso como uma ameaça ou como uma oportunidade de nos tornar gestores mais completos, além de profissionais de Recursos Humanos mais robustos, que agregam tanto para o ambiente competitivo das empresas, quanto para o bem-estar, a realização e a felicidade das pessoas.
Eu, como uma eterna otimista, escolho a segunda alternativa.