Todo dia o mesmo ritual: o pai extenuado chega à noite em casa após mais um duro dia de trabalho. Seu filho, com os olhos cheios de admiração, abraça-o, trocam algumas palavras sobre a escola e se despedem com beijos na face, o “boa noite” e o “durma com os anjos”.
Certo dia, com a voz tímida, o garoto pergunta ao pai, que acaba de chegar:
— Papai, quanto você ganha por hora?
O pai surpreso, desconversa. O filho insiste:
— Papai, quanto você ganha por hora?
O sempre ocupado pai promete uma resposta para o dia seguinte, mas se aflige com a pergunta. Passado algum tempo, dirige-se ao quarto do filho e o encontra deitado.
— Filho, você está dormindo?
— Não, papai! − responde o garoto.
— Querido, eu ganho 28 reais por hora.
O filho levanta-se da cama, abre a gaveta e, entre notas e moedas, conta 28 reais. Abraça o pai com ternura e, com os olhos cheio de lágrimas, pergunta:
— Você pode me vender uma hora do seu tempo?
Esta conhecida e singela história enseja a reflexão sobre a disponibilidade de tempo para com os filhos, os quais, mais cedo do que se pensa, compreenderão
a) a árdua luta dos pais pela sua sobrevivência profissional;
b) o necessário cumprimento dos deveres no importante papel de provedores;
c) que a dedicação ao trabalho é fator de realização pessoal e modelo de responsabilidade.
Busca-se, evidentemente, a prevalência do bom-senso, da medida, do equilíbrio entre a vida profissional e a vida familiar. Nesse contexto, importa mais a qualidade do afeto que a quantidade de tempo disponível para os filhos. O abraço afetuoso, o beijo estalado, a imposição de limites, o diálogo objetivo e adequado à idade, o acompanhamento do rendimento escolar, a presença nos momentos de lazer ou doença e a transmissão (pela palavra e pelo exemplo) de valores éticos e de cidadania podem ser praticados diariamente – com ênfase nos finais de semana – por pais que trabalham cerca de oito, nove ou dez horas por dia.
O consultor Gutemberg B. de Macedo dá seu depoimento em um de seus livros: “Conheço executivos bem-sucedidos que mantêm uma vida balanceada. São bons profissionalmente e, até prova em contrário, bons maridos, bons pais, bons líderes e bons cidadãos. O segredo? Saber dividir, compartimentar esses diferentes papéis. É preciso parar para refletir com profundidade. A vida é uma bênção de Deus. Desequilibrá-la é destruí-la. E destruí-la é uma espécie de estupro da própria divindade. Se Ele descansou, quem afinal você pensa que é para querer ir além?”.
“Devo dar segurança do meu amor” – esse deve ser um mantra diário de todo pai. Significa, sim, menos lazer, menos convivência com os amigos, menos academia. Mesmo cansados, podem ir além para cumprir o papel de pai (ou mãe). A paternidade responsável é uma missão e um dever a que não se pode furtar. No entanto, veem-se nas escolas filhos órfãos de pais vivos. E, na maioria das vezes, falta de tempo é apenas uma desculpa para a sua omissão. A vida profissional, apesar de suas elevadas exigências, pode muito bem ser ajustada a uma vida particular equilibrada. É uma questão de ênfase e dosagem de tempo.